A sala de treino estava silenciosa, exceto pelo som ritmado dos pés descalços contra o tatame. O sol da tarde entrava pelas janelas altas da U.A., iluminando a figura atlética que se aquecia no centro da arena. Rumi Usagiyama, a heroína Mirko, movia-se com leveza felina, esticando os braços sobre a cabeça, os músculos definidos reluzindo sob o tecido justo de seu uniforme esportivo.
Na lateral, parado como uma estátua de gelo, estava Todoroki Shouto.
— Então, você é o moleque que todo mundo idolatra por aí, hein? — disse Rumi, girando o pescoço com um estalo. — Não parece muito resistente, Shouto-kun.
— Eu sou resistente — respondeu ele, seco, tentando não olhar para as pernas expostas da heroína que pareciam ter sido esculpidas em mármore. Ou por alguma divindade pervertida.
— Veremos. Quero ver se esse seu poder duplo vale alguma coisa sem a sua zona de conforto.
Ela deu um salto curto, como se fosse natural conversar enquanto se aquecia com chutes giratórios, cada um cortando o ar como uma lâmina. Todoroki engoliu em seco. Não era o tipo de treinamento que ele esperava quando aceitaram ajuda de heróis profissionais para a fase de obtenção da licença provisória.
Bakugo estava com Best Jeanist. Todoroki… com Mirko.
O universo tinha senso de humor.
— Vamos fazer uma sessão corpo-a-corpo. Sem poderes. Só técnica — ela avisou, com um sorriso afiado. — Pode parecer injusto, mas prometo pegar leve. Um pouco.
Ele assentiu, deslizando para o tatame com passos firmes. Postura defensiva, foco no centro de gravidade, olhar sério. Mas não adiantou muito. No primeiro movimento dela, já estava desequilibrado, sendo puxado pela cintura e caindo de costas no chão.
THUMP.
O impacto foi amenizado pelo tatame, mas não pela situação. Rumi estava ajoelhada sobre ele, uma perna de cada lado do seu quadril, o rosto perigosamente próximo. O cabelo branco e as orelhas de coelha caíam ao redor dela como uma moldura selvagem.
— Você precisa reagir mais rápido. Se eu fosse uma vilã, já teria quebrado sua clavícula — disse ela, sem sair de cima.
Todoroki tentou não corar. Tentou muito. Mas o calor no rosto entregava tudo.
— P-pode sair de cima?
— Hm? — Ela inclinou a cabeça, levemente. — Ah, isso te incomoda, Shouto-kun?
Ela rebolou sutilmente só para provocar. Não era um gesto grosseiro, era pior: era sutil o suficiente para parecer inocente. E proposital demais para ser.
— Eu… estou tentando manter o foco — ele disse, desviando os olhos.
— Foque no momento, então. — Ela se inclinou mais. — Você vai lidar com heroínas, vilãs, civis… nem todas vão respeitar seu espaço pessoal, Shouto-kun. E nem sempre você vai ter tempo de pensar. Vai ter que reagir com o corpo.
Ela se afastou finalmente, e ele sentiu o ar voltar aos pulmões. Mas o treino estava só começando.
As horas seguintes foram uma coreografia de quedas, bloqueios, movimentos presos, respiração entrecortada e a frustração crescente de Todoroki em tentar ignorar o jeito como ela sorria a cada vez que o derrubava — ou o modo como o corpo dela pressionava o dele em posições questionáveis sob a desculpa de “aprimorar reflexos”.
A gota d’água veio durante um exercício de resistência.
— Vai ter que me tirar de cima de você usando força, e sem usar poderes — ela disse, mais uma vez montando em seu tronco com naturalidade. — Isso é simulação de combate.
— Isso é humilhação — respondeu ele, tentando manter o olhar nos olhos dela, e não... no decote que espiava pela regata.
Ela sorriu com um canto da boca, os olhos vermelhos estreitos como os de uma predadora.
— Vai ficar parado? Ou vai me surpreender, Shouto-kun?
Ele se mexeu. Ela contra-atacou com facilidade, empurrando-o de volta ao chão. A mão dela escorregou no ombro dele, mantendo-o preso, e o contato de pele contra pele foi direto.
A descarga de calor entre eles foi inevitável — parte do poder de Todoroki escapou involuntariamente, e vapor começou a subir entre seus corpos.
Ela o olhou nos olhos. Longamente. Depois sorriu de novo, dessa vez mais... lenta.
— Está esquentando, Shouto-kun.
Ele afastou o rosto, corado.
— Desculpe. Reflexo. Não costumo... treinar assim.
— E como costuma treinar?
— Normalmente com... roupas mais largas. Pessoas menos... — ele procurou a palavra certa — ...intensas.
Ela riu. E foi a risada mais sensual que ele já ouviu em toda a vida.
Ao fim do treino, Rumi jogou uma toalha úmida sobre o ombro e caminhou até ele, que ainda tentava regular a respiração. Os cabelos bicolores grudavam na testa suada.
— Mandou bem. Mais do que eu esperava.
— Achei que você fosse me matar — murmurou ele.
— Eu mataria… se fosse uma simulação mais realista — ela disse, com os olhos semicerrados. — Mas tem potencial. E resistência. Só precisa aprender a lidar com distrações. Tipo mulheres bonitas, Shouto-kun.
Ele arregalou os olhos, mas ela já estava saindo da sala. No limite da porta, virou o rosto por cima do ombro e soltou, como quem comenta o tempo:
— Da próxima vez, vamos treinar com menos roupa. Só pra testar a disciplina, Shouto-kun.
E sumiu no corredor.
Todoroki permaneceu imóvel por alguns segundos. Depois soltou um suspiro, encostou a cabeça contra a parede fria e murmurou para si mesmo:
— Não vou sobreviver a mais uma sessão com essa mulher.
Mas no fundo, uma parte dele… queria tentar.